segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Você conhece o Raul?


                                                Max Gehringer*


Durante  minha vida profissional, eu topei com algumas figuras cujo sucesso
surpreende muita gente.
Figuras  sem  um  vistoso  currículo  acadêmico,  sem um grande diferencial
técnico, sem muito networking ou marketing pessoal.
Figuras como o Raul.

Eu  conheço  o Raul desde os tempos da faculdade. Na época, nós tínhamos 
um colega de classe, o Pena, que era um gênio. Na hora de fazer um trabalho 
em grupo,  todos nós queríamos cair no grupo do Pena, porque o Pena fazia 
tudo sozinho.  Ele  escolhia  o  tema, pesquisava os livros, redigia muito bem e
ainda  desenhava a capa do trabalho - com tinta nanquim. Já o Raul nem dava
palpite.  Ficava  ali  num canto, dizendo que seu papel no grupo era um só,
apoiar  o  Pena.  Qualquer  coisa  que  o Pena precisasse, o Raul já estava
providenciando, antes que o Pena concluísse a frase.
Deu no que deu.

O  Pena se formou em primeiro lugar na nossa turma. E o resto de nós passou
meio  na  carona  do  Pena  -  que,  além  de nos dar uma colher de chá nos
trabalhos,  ainda  permitia  que a gente colasse dele nas provas. No dia da
formatura, o diretor da escola chamou o Pena de "paradigma do estudante que
enobrece  esta  instituição  de ensino". E o Raul ali, na terceira fila, só
aplaudindo.

Dez  anos  depois,  o  Pena  era  a  estrela da área de planejamento de uma
multinacional.  Brilhante  como  sempre,  ele  fazia  admiráveis  projeções
estratégicas de cinco e dez anos.
E quem era o chefe do Pena? O Raul.
E como é que o Raul tinha conseguido chegar àquela posição? Ninguém na
empresa sabia explicar direito.

O  Raul  vivia  repetindo  que  tinha  subordinados  melhores do que ele, e
ninguém  ali  parecia  discordar  de  tal  afirmação.  Além  disso,  o Raul
continuava  a  fazer  o  que  fazia na escola, ele apoiava. Alguém tinha um
problema? Era só falar com o Raul que o Raul dava um jeito.
Meu  último  contato  com  o Raul foi há um ano. Ele havia sido transferido
para Miami, onde fica a sede da empresa.

Quando  conversou  comigo,  o  Raul  disse  que havia ficado surpreso com 
convite. Porque, ali na matriz, o mais burrinho já tinha sido astronauta.
E  eu  perguntei ao Raul qual era a função dele. Pergunta inócua, porque eu
já  sabia  a  resposta. O Raul apoiava. Direcionava daqui, facilitava dali,
essas  coisas  que,  na teoria, ninguém precisaria mandar um brasileiro até
Miami para fazer.

Foi  quando,  num  evento  em  São  Paulo,  eu conheci o vice-presidente de
recursos  humanos  da empresa do Raul. E ele me contou que o Raul tinha 
uma habilidade de valor inestimável:... ele entendia de gente.
Entendia  tanto  que  não  se  preocupava  em  ficar  à sombra dos próprios
subordinados  para  fazer  com  que eles se sentissem melhor, e fossem
mais produtivos.

E,  para  me explicar o Raul, o vice-presidente citou Samuel Butler, que eu
não sei ao certo quem foi, mas que tem uma frase ótima:
"Qualquer tolo pode pintar um quadro, mas só um gênio consegue vendê-lo".
Essa  era a habilidade aparentemente simples que o Raul tinha, de facilitar
as  relações  entre  as  pessoas.  Perto  do Raul, todo comprador normal se
sentia um expert, e todo pintor comum, um gênio. Era a principal competência 
dele.

* Max Geringer, é administrador de empresas, escritor, palestrante e autor de 
diversas publicações sobre gestão de carreiras e empresarial..

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